Hilário era um rapaz que vivia sozinho pelos lugares. Sempre seguindo os caminhos que a vida lhe guiasse. Até que um dia acontece uma briga em um bar e Hilário é preso. Ele fica perdido em meio à confusão, mas na delegacia fica sabendo de toda a situação e acusações que fizeram contra ele.
O governo fez alguns exames para descobrir se Hilário ingeriu álcool ou entorpecentes e assim saber se a genética dele revela se nele habita um lado criminoso. A partir do resultado, ele seria condenado a morte ou não. O “Caso Hilário”, como a imprensa já estava chamando, acabou ganhando notoriedade na sociedade.
Diante de toda a loucura que sua vida se tornou, Hilário ficava perdido em seus pensamentos. Só queria ter a sua liberdade de volta e poder viver sua vida tranquilamente, mas isso passava longe de acontecer.
No decorrer do tempo em que esteve ‘nas mãos do governo’, muita coisa mudou. Uma delas afetou o mundo dos livros. Ter eles em casa ou em qualquer outro lugar, se tornou algo proibido. As obras que resistiam podiam ser alteradas por outras pessoas, mudando o conhecimento nele presente e criando uma nova história, uma nova narrativa, um olhar diferente da realidade. Os livros digitais que não pudessem ser alterados, eram excluídos. No caso dos livros físicos, todos começaram a ser queimados. Ter livros em casa, nem pensar! Era crime… Eram tempos sombrios.
“Talvez o livro tivesse ido embora porque era hora de Santiago chegar. Talvez as coisas tivessem de ir embora, mesmo sendo triste, para que outras pudessem vir.”
Eis que surge o Santiago. Um homem misterioso, apaixonado por histórias, também solitário e que chega para morar em uma vila localizada em Portugal. Ele acaba conhecendo uma família que o acolherá em meio a solidão, principalmente ao conhecer Alice, mais conhecida como ‘Menina’.
“- Como você sabe que pode confiar em mim? – perguntou Santiago, sorrindo.- As crianças sempre sabem em quem confiar. Os adultos é que não sabem.”
Essa garotinha acenderá em Santiago a chama da esperança – que só restavam fagulhas no meio de todo o caos que o mundo se tornou após os livros serem banidos. Mas situações embaraçosas começam a acontecer e a convivência vizinha com a família de Alice se tornará complicada.
O que esses três personagens possuem em comum?
“Devemos resistir a tudo que nos desumaniza, e a eliminação das boas e velhas histórias, dos livros, é receita certa para a desumanização.”
Divido em três partes, o leitor é levado a embarcar numa história que pode soar bem surreal para alguns, mas que também beira a realidade – quem sabe num futuro próximo. Uma Era em que ter livros é considerado um crime, pois diziam que eles ‘congelavam a visão do autor’. Agora qualquer um podia modificar e construir a própria versão. Uma fase em que as bibliotecas deixaram de existir e se tornaram lendas. Uma época difícil para quem amava a literatura.
O escritor Fausto Luciano Panicacci, com sua escrita poética e reflexiva, nos apresenta personagens marcantes, cada um com suas particularidades. Hilário sempre foi solitário, órfão de carinho e pessoas que o acolhesse. Que fossem verdadeiros amigos. Parte da solidão de Hilário é preenchida ao conhecer um homem que se torna seu grande amigo.
No caso de Santiago, a família da ‘Menina’, principalmente ao manter uma amizade simples e verdadeira com a pequena Alice – que adorava ouvir suas histórias, já que também compartilhava da solidão, pois não tinha a atenção dos pais e era ignorada pela irmã.
Juntos, os três alimentam as esperanças dos leitores no decorrer da leitura. Eles são os sinônimos de resistência na obra. Mas nem tudo é perfeito e atitudes estranhas começam a surgir nessa relação afetiva que Santiago terá com a família da ingênua Alice. Por sinal, vocês irão se encantar com Ela. Uma garotinha inteligente, carinhosa, atenciosa, curiosa e observadora.
A cada página a narrativa se torna ainda mais instigante, repleta de mistérios e provocando bastante o íntimo do leitor. Da minha parte, o que posso dizer é que o livro é incrível. Confesso que comecei a ler a obra achando que seria de uma forma, mas o autor me surpreendeu completamente e superou minhas expectativas. E isso foi maravilhoso. Já a resenha foi um sacrifício escrever sem dar tantos spoillers rsrs.
A escrita do autor é poética em diversos momentos, mas ainda assim é fluida. Dá pra ler tranquilamente e suas palavras atingem o leitor de diversas formas. Cada um terá um efeito parecido ou bem mais diferente de acordo com as suas próprias vivências. De qualquer forma, a leitura está mais que indicada. Até posso dizer que é necessária.
O autor aproveita a obra para abordar diversos temas, como o poder dos avanços tecnológicos, o domínio avassalador que a censura possui e como ela pode destruir a nossa liberdade; como também reflete sobre a capacidade que a literatura tem de mudar as pessoas e, consequentemente, o mundo. Ao longo da obra ele também faz referência a obras de autores consagrados da literatura mundial.
“O Silêncio dos Livros” foi publicado através da Editora Pandorga. O livro tem a capa e contracapa bonitas, as páginas amareladas, a diagramação está muito bem organizada, inclusive com um bom tamanho de fonte. Além disso, a edição possui orelhas. A obra está bem caprichada para falar sobre um assunto importante: os livros e o esplêndido poder que eles possuem.
“As histórias ligam-nos nessa extraordinária aventura que é nossa existência. E os livros carregam-nas. Há outras formas de contar histórias? Evidente que sim. Mas não vejo meio melhor de preservá-las do que nos livros, cuja longuíssima existência, resistindo às guerras, à umidade, ao maltratar dos séculos, dá prova disso.”
📚Boa leitura, pessoal!📚